domingo, novembro 01, 2009

FALECEU ANTÓNIO SÉRGIO

«Faleceu o radialista António Sérgio, o "John Peel" português[John Peel, em português, em inglês]

Fotografia: Rita Carmo - Blitz


António Sérgio faleceu na noite de sábado, vítima de um problema cardíaco, aos 59 anos, após muitos anos de divulgação de novas bandas e mais de 40 ao serviço da rádio. Actualmente fazia o programa "Viriato 25" na Radar.

António Sérgio estreou-se na Rádio Renascença e tornou-se famoso com programas como "Som da Frente", "Lança-Chamas" ou "A Hora do Lobo".

Para Nuno Santos, director de programas da SIC e antigo colega de António Sérgio na Rádio Comercial, com a morte do radialista "fecha-se simbolicamente um ciclo" no mundo da rádio, a quem este nome se "manteve fiel até ao fim".

Nuno Santos guarda de António Sérgio a imagem de uma "pessoa que do ponto de vista profissional estava sempre frente".

«Aparentemente era uma pessoa fechada, muito metida consigo, mas um trabalhador infatigável», afirmou Nuno Santos, em declarações à TSF.

Luís Montez, dono da Radar, onde actualmente António Sérgio trabalhava, considera que este é "um mestre da rádio", "uma referência" ou o "John Peel português".

Montez afirmou que o radialista era um exemplo de trabalho e dedicação e "estava sempre preocupado com os ouvintes".

Luiz Montez contou ainda que António Sérgio foi mesmo trabalhar no dia em que morreu o pai e disse apenas: "os ouvintes estão à minha espera".

António Sérgio gravou ainda o programa da próxima semana, que será colocado no ar tal como previsto, garantiu o dono da Radar.

Para David Ferreira o amigo era não só um mestre na rádio, mas na própria atitude.

"Ele era um mestre logo na atitude, as pessoas de grande qualidade revelam uma mistura de juventude e maturidade ao longo da vida. O Sérgio tinha a maturidade que lhe dava o saber muito de música, mas ao mesmo tempo conservava a surpresa de quem começa e se consegue entusiasmar", afirma.

Este é um requisito que David Ferreira considera essencial para "uma verdadeira estrela da comunicação social, não para figuras de cartolina com muitas luzes em cima".

David Ferreira recorda também o momento que que conheceu António Sérgio quando este foi despedido da Valentim de Carvalho por ter feito um disco pirata, "porque achava que as editoras estavam completamente ignorantes com o punk que passava em Inglaterra".



António Sérgio, uma referência para os músicos

António Sérgio, que faleceu sábado devido a problemas cardíacos, era "uma das pessoas que estava mais à frente em termos musicais em Portugal", considerou hoje o músico Rodrigo Leão. Já Adolfo Luxúria Canibal disse que este nome "sempre foi uma referência".

"Era uma pessoa fantástica, talvez uma das primeiras pessoas que eu conheci da rádio. Foi há 28 anos, quando editámos o primeiro disco da Sétima Legião", acrescentou o músico, fundador dos Sétima Legião e dos Madredeus.

Rodrigo Leão recordou que a primeira entrevista que fez foi, precisamente, com António Sérgio, e destacou o "Som da Frente" como o programa que ouvia na adolescência.

Para Adolfo Luxúria Canibal, fundador, letrista e vocalista do grupo Mão Morta, António Sérgio "era a referência de quando eu era adolescente, de quando o rádio era o instrumento por excelência".

"As memórias são muitas. Fazia parte do meu crescimento musical. Pessoalmente deixa-me muito boas memórias", acrescentou.

Embora nunca tenha trabalhado com António Sérgio, Adolfo Luxúria Canibal destacou o facto dos Mão Morta sempre terem dado a conhecer em primeira-mão os seus trabalhos ao radialista.

"Sempre lhe dei primazia nos trabalhos que íamos fazendo. Era uma espécie de agradecimento pelo trabalho que ele fez e pelo crescimento musical de gerações nas quais eu me incluo", acentuou.



Perfil de António Sérgio

António Sérgio, último dos radialistas com programa de autor, morreu sábado à noite em consequência de um problema cardíaco, mas a sua influência nas ondas hertzianas estendeu-se ao longo dos anos, na divulgação da chamada música alternativa.

Homem da rádio, António Sérgio, de 59 anos, começou em 1968 na Rádio Renascença, seguindo as pisadas do pai, mas foi no final da década de 1970, quando ingressou na Rádio Comercial, que a sua popularidade se consolidou, ajudando a divulgar novos estilos e tendências da música moderna.

Programas como Rotação (de 1977 a 1980), Rolls Rock, Som da Frente (de 1982 a 1993), Lança-Chamas, O Grande Delta (de 1993 a 1997) e A Hora do Lobo, todos na Rádio Comercial, foram a sua imagem de marca na ondas da rádio.

António Sérgio fazia actualmente o programa Viriato 25 da rádio Radar, tendo inclusivamente gravado em estúdio o programa da próxima semana, que será posto no ar tal como previsto, garantiu Luís Montez, um dos proprietários daquela emissora.

Antes de entrar na Radar, em Dezembro de 2007, António Sérgio viu-se envolvido numa polémica na Rádio Comercial, quando a Hora do Lobo, o programa que aí mantinha foi cancelado, decisão que motivou uma onda de reacções e protestos de ouvintes.

«As pessoas que foram responsáveis [pela Comercial] consideraram que a manutenção daquele programa de autor era prestigiante para a rádio, mas agora já não acham», lamentou António Sérgio nessa altura.

João David Nunes, um dos fundadores da Rádio Comercial e que levou António Sérgio para a emissora da Rua Sampaio Pina, na década de 1970, disse hoje à Lusa que o radialista deixa uma "marca indelével" na rádio portuguesa.

O velório realiza-se a partir das 18:00 de hoje na Basílica da Estrela, em Lisboa e o funeral, para o Cemitério dos Prazeres, realiza-se segunda-feira, depois da missa de corpo presente, às 15:00.»


Artigos TSF

«António Sérgio - Bicho da rádio

Recorde aqui parte da entrevista de António Sérgio à BLITZ, publicada em Outubro de 2007.

O anúncio da sua saída de antena gerou uma onda de reacções, desde figuras públicas, como Miguel Esteves Cardoso, ao ouvinte anónimo. Surpreendeu-o esse apoio?

Ainda ontem pensei: em 2008 faço 40 anos de rádio. Já não é o bichinho da rádio que morde, já sou eu que sou o bicho da rádio! Todos estes anos a morder as pessoas em relação a uma forma de fazer rádio, ligada à divulgação musical. Senti-me um bocadinho babado com o texto do Miguel Esteves Cardoso.

Em rádio, estamos habituados a sentir-nos sozinhos. Sabemos lá se nos estão a ouvir dez ou dez mil pessoas. Ao longo dos anos o que percebi é que boa parte das pessoas de determinada idade atribui-me uma boa parte da sua formação musical, do "abrir a orelhinha". O apoio é uma festa no ego - e eu agradeço. Só espero que aquilo que alguns desejavam nas mensagens, que é ouvirem-me noutro lado qualquer, venha a suceder. A força com que eu fazia rádio mantém-se inalterada, e a vontade de descobrir música, enquanto houver saúde e orelhas, mantém-se intacta.

Não sente que parte dos que o apoiaram nem sequer sabiam que ainda fazia rádio?

É natural que sim. Os horários em que trabalhei em rádio foram sempre terríveis para quem tem de se levantar cedo.
Nos tempos em que certa música era mais difícil - uma boa parte da década de 80 e 90 - havia ouvintes que se davam ao trabalho de gravar para ouvirem ao fim-de-semana e anotarem os nomes. Uma coisa que é tristemente verdade é que a rádio há anos que vai perdendo uma fatia do auditório. Isto não é por acaso - boa parte das pessoas que ouviam rádio para descobrir música arranjaram outros métodos, muito antes dos iPods.

Isto é uma facada que sinto em mim mesmo - a rádio, para mim, é a primeira-dama. Aquilo que me veio a acontecer é triste para mim, é mau para os ouvintes que ainda me acompanhavam - e que não eram assim tão poucos pelo que se vai vendo-, mas a emissão em si não correspondia ao mau serviço que a Rádio Comercial ia prestando àqueles ouvintes.
As pessoas que a ouvem, ouvem aquilo que nós ouvimos nos supermercados ou na bomba de gasolina.

Quais foram para si os anos áureos da rádio em Portugal?

Os anos dos programas de autor na antiga Rádio Comercial, ainda pertencente à RDP. A rádio era ouvida com uma clubite muito especial. Uma das funções da rádio é espalhar magia: nós não temos cara, temos vozes, e isso ajuda a incendiar o imaginário dos ouvintes. E esta rádio de hoje, coitada, não incendeia absolutamente nada. Põe o ouvinte a um canto e diz-lhe: ouve isto, que não te maça, não te assusta, não te provoca, não te faz comprar discos.

Outra verdade: a rádio de hoje não te faz comprar discos - as rádios de autor conseguiam fazer as pessoas ter paixão por comprar música.»


Entrevista: Blitz

RITA CARMO

Teresa Salgueiro

Rui Pregal da Cunha

Lykke Li

Rita Carmo - Fotojornalista
- «Rita Carmo (n.1970, Leiria) é licenciada em Design de Comunicação pela ESBAL. Fotógrafa residente do jornal Blitz desde 1992.» [...]

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